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As minhas provas - 2010
 


101 KM PEREGRINOS - Ponferrada

7 de Maio de 2010 - 11h00
 

Cataloguei esta prova como sendo o meu maior desafio para este ano de 2010. Um percurso na distância de 101 km nos Caminhos de Santiago de Inverno em Ponferrada - Espanha (cerca de 150 km a norte de Portugal). Como não iria haver a prova dos 101 km de Ronda, esta seria com toda a certeza a prova de eleição para uma grande comitiva “Tuga” – cerca de 50 atletas.

Previa-se um tempo de chuviscos e uma temperatura de cerca de 12º C, e de facto durante a viagem na sexta-feira tivemos bastante chuva. Chegámos a Ponferrada cerca das 21 horas locais e já junto ao Pavilhão Desportivo se via o habitual aglomerado de atletas. Falava-se mais português que espanhol, tal era a quantidade de presenças lusas, quase todos já conhecidos nestas andanças.

Levámos os sacos para o pavilhão onde iríamos pernoitar e dispusemo-nos a levantar o dorsal. Logo aqui, verificámos a inexperiência desta nova organização. Houve quem estivesse cerca de hora a meia na fila para levantar o seu dorsal. Como não existia uma lista afixada com o nome e dorsal dos atletas, todos tínhamos de fazer fila para verificar o número no computador e só depois é que poderíamos proceder ao seu levantamento.

No nosso caso como chegámos tarde, a fila era longa mas de atletas de BTT ou duatlo, pelo que para “marchadores” apesar da ineficiência até foi rápido. Tinham-nos garantido que o valor de 5 € pago (referente ao envio do dorsal por correio, e que não o fizeram) seria devolvido no levantamento do dorsal. Foi-nos explicado na altura que só poderia ser devolvido no dia seguinte de manhã.

Juntamente com o dorsal recebemos alguma literatura, uma T-Shirt branca (de fraca qualidade) e o Passaporte para os carimbos dos controlos da prova, e dirigimo-nos ao pavilhão de futebol para a habitual “pasta-party”.

Outra desilusão! A ceia era defronte do pavilhão em mesas de madeira, mas a céu aberto e sujeitos aos chuviscos que teimavam a cair sobre nós. Um prato de massa com carne e uma salada mista dentro de alguidares colocados em cada mesa. Pão e água para acompanhar. Felizmente havia cerveja a copo num quiosque próximo e nem nos fizemos rogar!

A sobremesa, essa, veio do (delicioso) bolo de anos da Cátia em que cantámos os parabéns debaixo duma chuva que teimava em prevalecer. Comemos à pressa e fomos para o pavilhão desportivo para preparar a cama e deitar-nos.

Devido ao cansaço da viagem, rapidamente adormeci embalado pelos roncos e ressonar dos vizinhos espanhóis.

Sábado, dia da prova

Levantei-me cedo e preparei o saco para ficar aos 60 km. Nele coloquei o frontal, uma muda de roupa, uma camisola térmica, um corta-vento, gels e uma toalha, e dirigi-me à organização para proceder à entrega. Aproveitei para solicitar a devolução dos 5 €, e responderam-me para lá voltar no final da prova!!! Claro que contestei pois duvidada que alguém me devolvesse o dinheiro durante a madrugada. Exigi a devolução e lá foram destrocar dinheiro para me dar!

Embora me parecesse que haveria poucos abastecimentos sólidos, calculei que bastava levar dois gels até aos 60 km, onde teria mais no saco. Assim, preparei a bolsa do cinto de duas garrafas, com os gels, Reflex-creme, magnesona, telemóvel e passaporte. Vesti um corta-vento, chapéu… e lá vamos nós para o Estádio Municipal de Atletismo onde seria dada a partida.

Como o tempo se anunciava solarengo, optei por não levar o corta-vento pois tinha deixado outro para os 60 km.

Numa cópia mais fraca de Ronda, lá se alinharam cerca de 1300 BTTs que partiram meia hora antes dos atletas. Cinco minutos antes da hora prevista lá partimos nós. Nem me apercebi se houve ou não o habitual tiro de partida!!

Demos uma volta ao estádio e lá seguimos pelas ruas de Ponferrada. Para nosso espanto, à nossa frente surgiu um carro da Polícia que segurou os atletas (a passo) durante cerca de 3 km, até passarmos pelo Castelo quando entrámos nos trilhos.

Rapidamente chegámos ao primeiro abastecimento (6 km – Puente Boeza) onde serviram bebida hipotónica (mistura de isotónico com água). Aqui começámos a subir até ao Villalibre de La Jurisdicción onde tivemos água no 2º abastecimento. Depois descemos por um trilho até depararmos com um vale lindíssimo com casas de telhados de xisto, Santalla del Birezo (17 km). Pelas ruas empedradas passávamos sob alpendres de madeira já carcomida lembrando aldeias do Sec. XVII.  Já à saída da aldeia tínhamos abastecimento líquido e placas sinalizadoras dos BTTistas para a esquerda e Marchadores para a direita.

Saímos da aldeia e chegámos a Priaranza del Bierzo onde está uma imagem muito peculiar – um totem em madeira onde está esculpida a figura dum cavaleiro Templário do tempo das Cruzadas. Aproveitei logo para tirar umas fotos com o telemóvel e depressa se juntou um grupo de tugas para a foto da praxe.

De seguida deparámos com uma enorme subida até aos postes de alta tensão. Quase no topo, novo abastecimento. Desta vez era em lata – RedBull ou Fanta. Optei pela última. Olhei para a serra em frente e consegui escrutinar BTTs a subir a enorme encosta e desabafo com o grupo “Não é fácil para os BTTs de fazerem aquela subida!” Mal sabia eu!

Descemos de novo para Santalla del Bierzo (28 km) e encaminham-nos para a direita e logo me apercebo que vamos fazer a tal subida difícil das BTTs.  É aqui que começam a cair os primeiros chuviscos. No topo começamos a descer num trilho muito técnico até Villavieja (33 km), e deparamos com uma descida lamacenta e algo perigosa. No largo empedrado da aldeia situava-se o abastecimento mas das barras… nem vê-las!! O chão estava repleto das embalagens vazias, claramente deixadas pelos BTTs. Já aborrecidos com a falta do primeiro abastecimento sólido lá seguiu o grupo por um trilho floresta acima até ao Castillo de Cornatel a 850 mt de altitude. Na última descida tínhamos ultrapassado uma atleta feminina e agora na subida encontrámos outra, que deveria ser a primeira mulher.

Forçámos o andamento de modo a apanhá-la e puxámos pela Verónica que vinha connosco para que conseguisse o lugar cimeiro. Ela como boa trepadora rapidamente ultrapassou a atleta espanhola deixando-nos para trás. O Eduardo da Adefacec que vem connosco começa a ter indícios de cãibras, e paramos para lhe dar magnésio e pôr um pouco de Reflex. Pouco depois fomos alcançados pela Analice, e embora esta grande atleta dissesse que pouco importa o lugar onde ia, a verdade é que forçou a passada para também ultrapassar a atleta espanhola. A chuva parece que tinha parado quando atingimos o Castelo de Cornatel onde alcançamos a Verónica. Com ela seguia um atleta espanhol que nos confidenciou que a Verónica era a primeira “Chica” e que na frente da prova seguia um grande número de atletas portugueses.

A descida do Castelo era agora em estrada asfaltada até à aldeia de La Chana onde mais uma vez o abastecimento era líquido. Recomeçou a chover cada vez mais forte e com pouca probabilidade de parar. Enquanto todos vestiram um impermeável ou corta-vento, eu arrependi-me de não ter trazido o meu. O corpo já pedia mais que um simples isotónico ou gel energético e o Mimoso já amaldiçoava a organização. Aproximava-se a zona de Las Medulas onde se situavam as minas de ouro romanas, e o maior obstáculo da prova – a subida ao Mirador de Orellán (45 km).

Noto que o David Ferreira tem bastões e não os usa (porque lhe dá um ar bastante “pro”) e resolvo utilizá-los. Na realidade, bem utilizados (é preciso haver bom sincronismo) permite progredir nas subidas com menor sacrifício dos músculos lombares e quadríceps.

No inicio da subida ao Mirador encontro a minha esposa e as meninas do Mundo da Corrida que nos incentivam. A chegada ao topo pela estrada asfaltada foi difícil e logo seguida de outra subida em terra batida até finalmente chegarmos ao abastecimento que deveria ter fruta.

Meia maçã??! … nem podíamos repetir!! Inaceitável…
 Lá agarrei na meia maçã e comecei a descer para o vale enquanto mordiscava a única comida sólida. O vento era gelado e já desesperava por chegar aos 60 km onde poderia trocar de roupa por uma mais quente e poder vestir o corta-vento.

Durante a descida passavam por nós os BTTs a alta velocidade que quase nos atropelavam. Novo abastecimento e mais uma vez apenas líquidos. Chegamos a Puente de Domingo Florez e disseram-nos que teríamos mais dois km até ao Pavilhão onde poderíamos comer e trocar de roupa. O grupo apressou-se e fiquei para trás com o Eduardo até finalmente seguirmos a sinalização até ao pavilhão. Já se viam atletas que vinham em sentido contrário. Quando chegámos já o Ricardo se queixava que não conseguiam descobrir o saco dele. O meu, esse estava á vista e completamente molhado. Incompreensivelmente os sacos encontravam-se sob um toldo sujeito á chuva que caía transversalmente, quando podia ter sido colocado dentro do pavilhão. Do mesmo modo tanto a comida como o controle estavam à chuva.

Entrei dentro do pavilhão onde se encontravam mesas para massagem e uma banca com revistas para venda. Abri o saco e felizmente do lado molhado era onde estava o corta-vento. A camisola térmica estava húmida mas pelo menos serviria para me isolar do frio. Nem tentei mudar de meias ou de calções. Apesar da muda de roupa continuava a tremer.

A comida era apenas composta duma meia sandes de presunto, um bolo e uma lata de sumo. Comecei a comer a sandes mas o estômago rejeitava-a. Resolvi levá-la na mão e ir comendo aos poucos. A Verónica estava pálida e já falava em desistir. O Mimoso lá de despiu (usando-me como escudo) evitando os olhares curiosos e trocistas das “chicas” da banca de revistas. O Ricardo lá conseguiu finalmente descobrir o saco. Juntámos o grupo de novo, motivámos a Verónica e lá seguimos de novo trilho acima. O Marco Silva tinha-se juntado ao grupo. Com o corta-vento fechado até ao pescoço e de capuz na cabeça, frontal preso no cinto, lá fomos progredindo até ao cimo do monte. Só quase ao fim de quase 5 km é que parei de tiritar de frio e acabei de comer a sandes empapada pela chuva.

Chegados ao topo, começámos a descer em zigue-zague até chegarmos a Salas de La Rivera. Aqui só se via líquidos no abastecimento. Perguntei à senhora se não havia nada para comer e perguntou-me se queria banana. Claro que sim! Destapou um cesto por debaixo da mesa e deu-me meia banana dizendo que só seria um bocado por atleta. Chamei o resto do grupo que tinha ignorado o abastecimento e lá nos entregaram fruta a todos. Inconcebível, estes abastecimentos. Subindo pela estrada asfaltada lá virámos de novo para os trilhos e preparávamo-nos para a fase pior da prova, uma subida de quase 7 km até às Medulas.  

O trilho era lamacento, empinado e quase intransitável. Pelo caminho encontrámos vários BTT a pé com grande dificuldade de progressão. Alguns tentavam levar a bicicleta ao ombro mas quase sempre era queda certa. Após chegarmos de novo à estrada, cruzamos uma pedreira de xisto e deparámo-nos com uma descida cheia de lama, sem qualquer possibilidade de a evitar.

Lentamente lá conseguimos passar sem que ninguém caísse. Atravessámos a estrada e mais uma grande descida lamacenta. Com passadas curtas e com o apoio dos bastões rapidamente cheguei ao fundo da ladeira. Para meu espanto, a Verónica que é quase sempre a última nas descidas, chegava logo depois de mim. O restante grupo agarrava-se a ramos das árvores para ir descendo. Estávamos em Carucedo (78 km) e ainda tínhamos de atravessar a aldeia de Borrenes para chegar de novo a Santalla (86 km) onde haveria caldo quente.

Em Borrenes, fomos bastante aplaudidos à chegada. O abastecimento estava marcado num tronco em que talharam umas cuequinhas!! Desta vez o abastecimento era composto de sandes de queijo e presunto. O pão estava duro, mas eu abria-o e levava o presunto à boca enquanto retirava mais uma sandes para o caminho, perante os olhares estupefactos do pessoal da organização. O grupo mal esperou e seguiu de imediato. A ideia era chegarmos ao próximo abastecimento antes do anoitecer. Finalmente chegámos de novo a Santalla (onde já tínhamos passado por duas vezes) com cerca de 10 horas de prova.

Desta vez o abastecimento era mais substancial, composto de sandes e uma canja quente que soube mesmo bem. Acendemos os frontais e começamos a descer. Faltavam pouco mais de 15 km, e calculámos mais duas horas de prova o que daria um tempo final de cerca de 12 horas.

Mas o piso lamacento não dava sequer para correr. As quedas sucediam-se e progredíamos lentamente. Demoramos quase uma hora para fazer cerca de 5 km. O cansaço acumulava-se mas o grupo manteve-se coeso. Íamos passando o pessoal das BTT que caminhavam. A dada altura apanhámos um trilho estreito junto ao rio, em que lavavam as bicicletas com água para conseguirem andar.

Perto dos 92 km, chegámos a um ponte sinalizada com luzes azuladas, em que a organização estava a encerrar o trilho a mandar os atletas para a estrada. Disseram-nos para seguirmos pela estrada asfaltada e assim fizemos. Perto duma ponte a estrada dividia-se e ficámos na dúvida! Não havia qualquer sinalização. Optámos então por seguir a placa que indicava Ponferrada.

Uma recta interminável que nos levaria até á cidade. Pelo caminho fomos abordados pela polícia, e julgámos que estávamos perdidos, mas apenas nos perguntaram se necessitávamos de ajuda médica. Agradecemos e dissemos que não e incentivaram-nos a prosseguir. As poucas viaturas que passavam por nós apitavam com incentivos. Estávamos no caminho certo, pensámos!

Finalmente quando atingimos a primeira rotunda é que verificámos que não havia qualquer sinalização. Perguntámos a um rapaz qual era o caminho para o pavilhão e ele informou-nos que devíamos estar perdidos, pois o percurso deveria ser feito pelos trilhos e mostrou-nos o colete reflector da organização. Bolas! Mais uma vez nos perdemos numa prova.

A sinalização que até agora tinha sido perfeita, falhava quando faltava pouco mais de um km no Garmin. Era frustrante estarmos tão perto e termos de fazer mais distância que o previsto.

O grupo já estava a desmembrar-se. Á frente seguia o Marco, o Mimoso e o David. Eu seguia sozinho e a umas centenas de metros vinha o Ricardo, a Verónica e o Eduardo, todos já em dificuldade. Indicaram-nos que deveríamos seguir até uma rotunda com um cavalo, virar á esquerda até á próxima rotunda, de novo à esquerda até à segunda rotunda e na bomba de gasolina virar para o pavilhão.

Numa das viragens, perco o grupo da frente. Olho para trás e já não vejo o outro grupo. Pelo meu sentido de orientação atalho por entre as ruas até encontrar uma rotunda com repuxos de água que me pareceu familiar.

Aceno para um carro que vinha a passar para pedir informações mas este evita-me e não pára. Finalmente há um que o faz e abre ligeiramente o vidro para responder. Diz-me para seguir sempre a direito até ao Carrefour e depois virar à esquerda. É nesta altura que ouço uns gritos. É o grupo da frente que também se perdeu e encontrou-se comigo por acaso. Pergunto pelos outros mas não sabem responder. Digo-lhes que já sei o caminho e começo a correr num ritmo rápido enquanto telefono á minha esposa a dizer que devo estar a cerca duns dois quilómetros.

Acabo por chegar por detrás da meta para espanto de todos e finalmente dou a minha prova por concluída com 13h16’12 e mais de 2 km do que o previsto.

Pouco depois chega o resto do grupo, sendo o mais atrasado o Eduardo, a quem felicito por ter concluído a prova. O Ricardo Diez barafusta em espanhol com a organização devido à má sinalização nesta última parte do percurso. Apercebemo-nos então que alteraram esta última parte e que deveria existir alguém da organização pouco antes da ponte a indicar-nos o trilho para a esquerda.

Depois de nós ainda chegou mais um grupo de BTT e de atletas que fizeram o mesmo caminho que nós.

Recebemos um papel com o nosso tempo e posição, e dirigimo-nos ao pavilhão. Aqui tivemos de nos descalçar e recebermos o diploma, uma T-Shirt técnica e a medalha. A medalha essa, era apenas dada aos primeiros 101 atletas e nela estava gravada a posição na classificação geral, no meu caso o 37º lugar. O diploma era bonito, em formato A3 e com a figura do cavaleiro Templário que tinha visto em Santalla del Bierzo.

O abastecimento final era pobre… água e um daqueles bolos que tínhamos comido aos 60 km. Fraquito!! O que vale é que tinha bastante comida no saco. A fila para as massagens era grande e com apenas 2 massagistas e um podologista para tratar das bolhas dos pés, calculei que iria lá estar muito tempo e resolvi ir tomar banho e dormir. As instalações balneárias tão limpas no dia anterior, agora eram só lama.

Apenas consegui dormitar por um par de horas, o barulho era tanto que nem dava para descansar. Levantei-me para ir tirar um café à máquina e deparei-me então com uma mesa cheia de comida para receber os atletas que chegavam!

Francamente!! Parece que a fartura deveria ser só para os atletas mais lentos, pois para os primeiros (talvez por serem portugueses), não tivemos direito a nada. Embora sem fome, recolhi uma sandes, uma lata de sumo e dois bolos, para o pequeno-almoço e fui-me novamente deitar.

Mais uma ultra-maratona terminada. Apesar das dificuldades devido à chuva, à lama e com mais desnível do que tinham anunciado (2.800 mts em vez dos 2.100), ainda consegui fazer melhor tempo do que Ronda e ter concluído a prova em melhores condições físicas. Gostei!

Em resumo:

Uma prova com um percurso difícil, mas muito bonito e com paisagens espectaculares merecedoras dumas belas fotografias.

Penso que devido à inexperiência a organização não calculou bem os abastecimentos, embora tenham reforçado a sua qualidade em termos sólidos para a segunda parte do pelotão. De lamentar não ter sido dada uma medalha a todos os participantes que terminassem a prova.

Comparativamente com Ronda, os 101 Peregrinos têm um custo/benefício desequilibrado.

De certeza que na próxima edição estas situações estarão ultrapassadas, e que será uma prova a contento de todos.

Nesta primeira edição, a delegação Lusa ocupou os cinco primeiros lugares masculinos e os três primeiros femininos. Nos lugares cimeiros ficaram o Carlos Sá e Verónica Correia, respectivamente. Força “Tugas”!!

 

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LXVII MILLAS ROMANAS - MÉRIDA - 100 km
9 de Abril de 2010 – 21h00

Uma prova na distância de 100 km, com a particularidade de ser corrida em três circuitos com o seu início às 21 horas, pelo que quase toda é feita durante a noite. Também não existiria classificações embora fossem registados os tempos finais de cada atleta. Existiam também tempos-limite de passagem nos diversos pontos de controlo, sendo o ritmo mais rápido de 7’/km o que daria um tempo final na ordem das 12 horas:

1º Circuito – 27,5  km – sinalização Vermelha

2º Circuito – 27,7  km – sinalização Amarela

3º Circuito – 44,8  km – sinalização Verde (mesmo circuito para as XXX Millas)

Custo de inscrição: 20 € - prova principal e de 15 € para as XXX millas.

Alojamento gratuito para os atletas em Albergue.

Desconto na visita aos Monumentos principais da cidade.

…………..

Saímos depois do almoço na sexta-feira dia 9 e chegámos a Mérida – ao Pavilhão Polidesportivo Diocles cerca das 19h00 locais. Procedemos ao levantamento dos dorsais em que nos foi entregue um saco com diversa literatura, uma T-Shirt branca técnica, uma garrafa de vinho, um cartão com os diversos pontos de controlo para serem carimbados e um rutómetro (tipo roadbook com mapa, abastecimentos e informações dos itinerários do percurso).

Como o Albergue (situado a cerca de 5 km do Pavilhão) era apenas exclusivo aos atletas, tivemos de inscrever as acompanhantes na corrida das XXX Milhas para que pudéssemos todos usufruir do alojamento, tendo-nos sido garantido que ficariam os portugueses todos juntos.

Desde logo fomos excelentemente bem atendidos pela organização até porque pela primeira vez tinham uma grande participação de atletas portugueses (no ano passado apenas tiveram 1 a 2 atletas).

Apesar de existirem abastecimentos mais ou menos a cada 7 km, haveria sempre a possibilidade de serem alterados ou eliminados de acordo com o regulamento, pelo que verifiquei que muitos dos atletas estavam equipados com Camelbak, pelo que tomei a mesma opção. O tempo estava abafado e com uma temperatura de cerca de 16 graus, pelo que optei por vestir uma T-shirt e colocar dentro da mochila um corta-vento.

No final do primeiro e do segundo circuito voltaríamos ao Pavilhão Diocles e o terceiro e último seria no local de partida na Praça de Espanha. Havia a possibilidade de deixarmos um saco no roupeiro para podermos mudar de roupa entre circuitos.

Pelas 20h15 deslocámo-nos então até á Praça de Espanha (a cerca de 1,5 km do pavilhão) onde haveria o controlo de dorsais antes da partida que estava prevista para as 21 horas.

Aqui juntou-se a comitiva lusa composta pela Analice Silva, Verónica Correia, José Carlos Fernandes, Guilherme Hora, João Faustino da Hora, Jorge Mimoso, Carlos Santos, Tiago Martins, Antonio Rebelo, Ricardo Diez, Luis Miguel, Manuel Fonseca, Nuno Santiago e eu.

Com estupefacção e admiração, fiquei a saber que a “nossa” Analice também se tinha inscrito na prova de 30 km do Vale dos Barris em Palmela, e que iria fazer no dia seguinte aos 100 km de Mérida. Ousadia ou loucura, não deixo de fazer uma vénia a esta atleta de 66 anos de idade!!

Feito o controlo dos dorsais e receber os aplausos da organização para esta larga comitiva portuguesa, tiradas as fotos para o álbum das recordações e lá partimos todos (cerca de 350 atletas) precisamente à hora marcada.

1º Circuito – 27,5  km - "Circuito del Guadiana"

Um circuito citadino em que seguimos junto ao Rio Guadiana com a linha de caminhos-de-ferro à direita, num trilho plano de terra batida até à estação de Aljucén (6 km) onde haveria o retorno e primeiro controlo. Voltando pelo mesmo trilho cruzaríamos o rio pela ponte nova virando depois à esquerda acompanhando o rio até à pista de Alange (km 18,7) onde regressaríamos depois até cruzar de novo o rio (desta vez pela ponte romana) e depois à direita até ao Pavilhão Diocles.

O percurso estava marcado com setas reflectoras vermelhas, luzes ou pendentes fluorescentes. Logo no inicio a comitiva lusa apoderou-se da cabeça do pelotão. Com bastante dificuldade se manteria o ritmo desejado dos 7’/km. Eu, o Carlos Santos e o Ricardo Diez lá íamos à frente da corrida num ritmo perto de 5’30/km, até chegarmos ao 1º controlo com 34’. Tivemos de aguardar 8 minutos para tornarmos a partir. Entretanto ia-se fazendo contas, de correr a 6´30 e usar o tempo de espera para nos abastecermos e carimbarmos o controlo.

Até agora não tinha havido necessidade de utilizar o frontal. Ligámo-lo quando retomámos a corrida. No regresso reparámos que nos cruzávamos com muito poucos caminheiros o que significava que embora marchando conseguiam atingir ritmos impressionáveis.

Chegados á ponte nova toda iluminada, mostrava uma paisagem lindíssima sobre a cidade. Á saída, tínhamos um abastecimento só de água enquanto entrávamos de novo no trilho em direcção ao segundo posto de controlo e de retorno. O percurso em estradão, tendo o rio à esquerda torna-se agradável, passando pontões e jardins. Mais uma vez tivemos de aguardar uns bons minutos para recomeçarmos o regresso. O abastecimento desta vez tinha fruta, sandes, bolos e isotónico.

O regresso ao pavilhão tornou-se mais rápido pois os minutos conseguidos iriam permitir um breve descanso e permitir mudar para uma roupa mais quente pois a noite já arrefecia bastante.  O pelotão da frente já rodava nos 4’15/km quase numa tentativa de ver quem seria o primeiro atleta a chegar ao pavilhão. Juntamente com o João Faustino lá nos conseguimos colar à dianteira até cruzarmos a ponte romana empedrada. Eu, como sempre, não me dou bem com este tipo de piso e reduzo o ritmo. Á saída da ponte verifico que o João Faustino sai do percurso. Dou-lhe um grito e ele volta para trás. Quem ia à frente já ia perdido! Entretanto juntam-se mais dois atletas espanhóis e lá seguimos em grupo as setas vermelhas fazendo depois um sprint final mal avistámos o pavilhão.

Demorei 2h57’30” a fazer o 1º circuito num ritmo de 6’27 /km.

Afinal, com a frequência e qualidade dos abastecimentos não justificava levar o Camelbak, pelo que optei apenas pelo cinturão de 2 garrafas enquanto vestia uma camisola térmica.

Só poderíamos partir daí a 13’ (00h11) e com um limite até à 1h30 da manhã para fazer 10 km até ao próximo abastecimento. Saí eu, o Ricardo Diez e a Verónica para o 2º circuito às 00h24 e o que nos daria pouco mais de 1 hora para fazer os primeiros 10 km.

2º Circuito – 27,7  km - "Circuito de Proserpina"

Normalmente bastaria menos de uma hora para fazer os primeiros 10 km. Só que ao km 2 deste circuito, mal chegamos aos arcos do Aqueduto de S. Lázaro e entramos no trilho, entramos na serra com uma subida de cerca de 5 km. A subida até nem é muito íngreme, mas o piso é muito irregular, pedregoso e muito sulcado pela água. A escuridão é total e com dificuldade conseguimos ver a sinalização que aqui se resumia a fitas vermelha e branca.

A sinalização é deficiente! Por vezes andamos km sem ver uma única fita de confirmação, noutras vezes o trilho abre em três e não existe sinal nenhum. Optámos por ir cada um pelo seu trilho gritando em contacto, para cerca duns 100 a 200 metros depois os três trilhos se unirem num só. O vento gela-nos a cara e progredimos devagar para evitarmos qualquer queda. A Verónica paga caro a ousadia dum trote rápido e estatela-se no trilho. Felizmente não se aleijou e lá continuámos, desta vez um pouco mais lentos.

Continuamos até Alto de Las Laderas, quando no meio da escuridão alguém grita “Água!” De princípio pensei que fosse algum atleta em dificuldades, mas afinal era alguém da organização, sozinho e embrulhado, deitado em cima de paletes de água. Mais em frente deparámo-nos com um lamaçal autêntico. Após esta epopeia, ainda tivemos de atravessar um túnel cheio de água mas que conseguimos saltitando sobre umas pedras que lá estavam. Cruzamos a estrada asfaltada e finalmente o abastecimento, 2 km depois do previsto, tendo já os atletas partido há uns bons minutos atrás.

Seguimos novamente por um estradão tendo à nossa esquerda uma cerca em arame na qual aparecia uma fita sinalizadora de vez em quando. Perto duma vacaria, quase que não nos apercebemos que o percurso deveria entrar por uma “nesga” nessa vedação, mas felizmente somos alertados por dois caminheiros. Num trilho irregular, entre poças de água, bosta de vaca e respectivo aroma, lá conseguimos passar esta propriedade tendo á saída as grades para evitar a saída do gado, e descemos para o Lago Proserpina.

O lago é lindíssimo! Calmo, sossegado, iluminado por candeeiros em bola colocados em cada recorte do lago, ouvindo apenas o coaxar das rãs e eventualmente um ressonar dalgum pescador. Enquanto dormem nas suas tendas Iglo, as canas-de-pesca continuam ávidas à espera dalgum peixe que apareça. No final do lago aparece o abastecimento. Desta vez, comemos fruta, bolos secos e um Isostar. Quando nos preparamos para partir, aparece o Jorge Mimoso que nos grita para esperarmos um pouco.

O grupo, agora de 4, desce à rotunda segue em frente até que em plena curva á esquerda aparece uma seta para entrarmos no trilho. Quase que não víamos a sinalização.

Este trilho de pedra solta e tortuoso leva-nos às antenas da Sierra Carija. A escuridão é imensa, e apesar do céu estrelado é com dificuldade que vislumbramos o melhor percurso onde pisar. A descida faz-se bem e chegamos a Mérida onde atravessamos um túnel que nos leva a um relvado. Aqui a seta indica-nos para seguir a rua à esquerda, mas quando chegamos à rotunda não existe mais sinalização nenhuma. A preocupação em descobrir as setas era tanta que nos esquecemos que o rutómetro indica o nome das ruas. Mas pelo azimute, resolvemos subir uma rua que nos leva ao Anfiteatro Romano e aí entramos de novo no percurso correcto. Apesar de nos perdermos apenas uma centena de metros perdemos também muito tempo.

Prestes a chegar ao Pavilhão cruzamo-nos com o grupo da frente de cerca de 10 atletas entre eles o João Faustino, que incentivamos.

Este circuito demorou-nos 3h24’07 a um ritmo de 7’20/km.

Já vamos com 6h48’ de prova e com uma distância percorrida de 57,5 km. Faltam os 44,8 km do 3º circuito o que significa que é mais de 100 km.

Honestamente este 2º circuito não é aconselhado a fazê-lo sozinho! Muito difícil, isolado e mal sinalizado!

Agora é comer algo, mudar de roupa e vamos para mais uma maratona + uns aquecimentos!

3º Circuito – 44,8  km - "Los Pueblos"

Tirei a camisola térmica e vesti a pólo do Clube para as fotos no final, mudei de meias, comemos uma massa com salsicha e um caldo deslavado servido num copo e demorámos pouco mais de 15’. O Guilherme Hora tinha saído à nossa frente uns minutos antes.

Já tínhamos reparado que os primeiros dois km deste circuito eram comuns aos do anterior, pelo que íamos à vontade.

Pouco antes da rotunda começamos a cruzar-nos com a malta Tuga: O Zé Carlos Fernandes, o Tiago Martins, o António Rebelo e o Nuno.

Descemos para o Aqueduto de S. Lázaro e apressámos o passo para apanhar o Guilherme. Nesta pressa perdemos de novo a sinalização. Uns minutos a procurar na rotunda e nada! Fomos ao rutómetro e indicava “Passeio pedonal na margem esquerda do Rio Albarregas”. Bolas! Era a uns 100 metros abaixo. Lá seguimos todos por este passeio ajardinado com o rio à direita até sairmos da cidade e entrarmos de novo no trilho em direcção á serra.

Primeiro, junto à auto-estrada e depois num estradão longo e sinuoso. Nesta altura o Guilherme fugia do grupo para pouco mais á frente o apanharmos até que desapareceu por completo. O Mimoso queixa-se de náuseas, provavelmente do café com leite que bebeu no pavilhão e diz para seguirmos que ele fica sozinho. Animamo-lo com a promessa de continuarmos juntos até ao fim!

A Verónica “carimba” uma segunda queda, felizmente sem qualquer mácula, e começa a ter mais cuidado onde pisa. Já caminhamos mais do que corremos!

Poucos km mais à frente, sou eu que maldigo a escolha que fiz na troca de roupa. Para ficar bem no boneco, esqueci-me de trazer um corta-vento. A temperatura desce e o frio gélido que se faz sentir arrefece-me demasiado o corpo pois o ritmo é baixo. Tento correr sempre atrás do Ricardo e da Verónica servindo eles de protecção ao vento a fim de evitar uma hipotermia. Aqui valeu-me bem o apoio do grupo!

Nesta subida somos apanhados pelo Tiago, que me causa uma certa inveja não só pela frescura que faz no trote mas mais por vê-lo quentinho dentro dum corta-vento (quase que me sinto tentado a pedir-lho!). Dizemos que o Guilherme vai um pouco à frente e ele segue no seu encalço.

Quase no topo, apanhamos dois atletas espanhóis que só caminham e que embora os ultrapassemos a correr… quando paramos para caminhar eles tornam a apanhar-nos numa passada certa e larga.  Este tipo de concorrência desperta em mim um pouco de adrenalina  e sinto-me de novo mais quente e motivado. Tanto que a certa altura quase que nos perdíamos por minha culpa não fossem os espanhóis a chamarem-nos.

Mas tal como nas batalhas ancestrais, os lusos prevaleceram e deixámo-los para trás até chegarmos ao abastecimento líquido fornecido por um só elemento que dormitava dentro dum jipe.

Seguindo depois paralelamente á estrada asfaltada (que mais valia termos ido nela, pois o trilho marcado pelos sulcos dos tractores era quase impraticável), até virarmos à esquerda de novo para o trilho. Amanhece! Arrumamos os frontais e caminhamos nas subidas e descemos a trote até chegarmos à vila. Pelo caminho passam por nós tractores carregados de alfaia para o gado. Já só falta uma meia-maratona!

Chegamos a S. Pedro e somos acolhidos pelo pessoal dos abastecimentos que nos congratulam pelos muitos e bons portugueses. Pela lista de controlo informam-nos que a Verónica é a primeira mulher e que á nossa frente seguem apenas 15 atletas (os craques). Alcançamos mais dois atletas que caminham pela subida asfaltada e nos acompanham até ao topo. O percurso agora era de asfalto com subidas até ao viaduto e novamente uma decida prolongada até nova subida a novo viaduto. Ao terceiro, descemos à direita. Já só falta uma corrida de 15 km! O Ricardo começa a acusar o esforço e desta vez já sou eu e o Mimoso que o tentamos animar!

Novo abastecimento em Trujillanos, cruzamos a estrada e passamos sob um túnel cheio de água mas que afinal era de pouca profundidade. O trilho agora de terra batida é monótono. Vimos Mérida ao longe e um estradão longo e encarniçado de sobe e desce. Tentamos aumentar o tempo a correr em vez de caminhar mas o percurso não nos anima. Um atleta vestido de branco e de luvas sempre a falar ao telemóvel passa por nós e com um sorriso desaparece no estradão.

Com pouco menos de uma “corridinha do Tejo” e Mérida parece-nos cada vez mais longe.

Eu e o Mimoso já fazemos contas ao tempo final, e no ritmo que levamos é possível terminar a prova em menos de 13 horas, o que seria um sucesso. Vale-nos a entreajuda do grupo para diminuir a contagem final dos últimos km.

Antes de finalmente vermos a placa de entrada na cidade atingimos os 100 km no GPS com um tempo de 12h37”. Sendo o erro provável de cerca de 3 km, tentamos chegar antes das 13 horas de prova. É nítido o esforço do Ricardo em tentar que consigamos esse objectivo, sempre acompanhado pela Verónica, e eu e o Mimoso na dianteira.

Passamos o túnel e começamos a conhecer o percurso. Subimos a Santa Eulalia e começamos a descer para a Praça de Espanha. Falta pouco menos de um km e este foi feito a um ritmo de 4’/km e conseguimos!! 12h59’40” e chegámos nos primeiros 20 atletas.

Recebido o tão almejado troféu, as fotos habituais e toca a voltar ao pavilhão para um bom banho e retomar forças com uma boa refeição!

Uma prova que recomendo para quem pretenda iniciar-se em ultra-maratonas, desde que acompanhado.

O custo-benefício é óptimo, pois pelo valor da inscrição tem-se bastante mais no retorno.

 

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I TRILHOS DE ALMOUROL - 40 km
7 de Março de 2010 – 10h00

Já há muito tempo que não ia à “Terra dos Fenómenos” (Entroncamento), pois passei lá algum tempo a cumprir tropa no Centro de Instrução do B.S.M., há quase trinta anos atrás.
Assim, segui eu e a minha esposa no sábado à tarde em direcção a esta vila. Está irreconhecível. A não ser a zona da estação, não reconheço nada. Procuro o Pavilhão Desportivo, seguindo as indicações na vila, mas quando lá chego dizem-me que deveria procurar o complexo desportivo nas piscinas. Rapidamente chego lá e encontro o local onde a CLAC (Clube de Lazer, Atletismo e Competição) faz a entrega dos dorsais.

Inteiro-me então da corrida, do seu percurso e das dificuldades que a organização teve de enfrentar para levantar uma prova deste género. Fico então a saber que devido às condições atmosféricas, e às grandes chuvadas, o percurso iria ter cerca de 38 km em vez dos 35 previstos, e que caso houvesse durante a noite alguma descarga de água da Barragem, o percurso teria novamente de ser revisto havendo a possibilidade de se aumentar mais uns 2 km.

Levantados os dorsais, juntamente com um saco com uns panfletos locais, uma T-Shirt azul clara e uma garrafa de vinagre, lá fomos jantar e preparar a dormida. Neste caso, em vez do habitual “solo duro”, iríamos poder dormir nas camaratas do Regimento de Manutenção.

Quando cheguei defronte do B.S.M. (Batalhão do Serviço de Material)  e me dirijo ao militar da porta-d’armas verifico com surpresa que se trata duma mulher!! (No meu tempo não havia disto!!). Diz-me que o BSM já não existe e que agora se designa Regimento de Manutenção e indica-me o portão onde irei pernoitar. Exactamente no antigo C.I. (Centro de Instrução) onde estive no passado. Foi agradável reviver os momentos ali passados. Só que agora haveria camaratas para homens e outras para senhoras. Quando entrei na camarata dos homens, já lá estavam alguns atletas (Pedro Marques, Carlos Santos, o Tiago Martins e o Hugo Velez que tinha vindo de bicicleta desde a margem Sul). Mais tarde juntaram-se a nós mais atletas, entre eles, o Rui Carvalho, o Tigre e o Manel Fonseca.

Domingo: 8h30

O tempo estava perfeito para correr. Enquanto os caminheiros se dirigiam para a estação dos comboios donde seguiriam para a estação de Almourol, os atletas seriam transportados em autocarros para os locais de partida (Constância : Mini-Trilhos - 19 km, e Aldeia do Mato: Trilhos – 38 km).

Após um ligeiro aquecimento, um controlo inicial dos atletas e um pequeno “briefing” da prova transmitido pelo José Brito da CLAC, lá foi dada a partida exactamente á hora prevista. Após uma ligeira subida lá descemos vertiginosamente para depois se começar a “separar o trigo do joio”, ou seja, uma subida íngreme em piso muito técnico mostrando o quão empapados de água estavam os trilhos.

Tentei ainda seguir no grupo dos primeiros mas chegados lá acima a diferença entre mim e eles já era notória. Tendo o Tiago Martins como companheiro de prova, seguimos pelo cume da serra até umas casas em ruínas, entrando depois por umas hortas, subindo declives sempre em erva alta com um terreno enlameado. Como o percurso era desconhecido para todos, íamos tendo atenção em seguir as fitas sinalizadoras, embora nesta zona alguém pudesse atalhar bastante se conhecesse o trajecto.

Ao chegar perto da barragem, encontro o Brito e a Otília, que nos remetem para a estrada alcatroada, enquanto recolocam as fitas sinalizadoras, devido a um imprevisto causado por alguém que antes tinha aceite a passagem dos atletas e que agora a negou soltando os seus cães.

Nesta descida em alcatrão para o topo da barragem, descolo do Tiago e rapidamente alcanço dois atletas do Praticante (o Cirilo e outro colega). Contornada a barragem e logo na descida encontramos o primeiro abastecimento de líquidos e começamos a descer para o rio em degraus de cimento. A imagem da descarga de água da barragem do Castelo de Bode é lindíssima envolvendo-nos num nevoeiro causado pelos borrifos de água. Mas a nossa atenção está pregada no trilho inclinado que pisamos. A cada passada o atleta do praticante escorrega na relva molhada e digo-lhe que deveria ter calçado uns sapatos de trail e não uns de estrada, pois estes têm menos aderência neste tipo de relevo.

Seguindo paralelamente ao rio Zêzere, entramos num estradão em que também decorre uma prova de BTT em sentido contrário. Ambos os tipos de atleta respeitam-se e incentivam-se mutuamente. Neste estradão, saímos e entramos nele por diversas vezes sempre com a indicação dos elementos da organização, em trilhos técnicos de extrema dificuldade. Entre árvores, ramos, pequenos riachos, sempre com uma subida íngreme de volta ao estradão. É aqui que deparamos com uma ponte móvel sobre o Rio Nabão, especialmente montada pela Engenharia Militar para este evento com uma distância de quase sessenta metros.

Á saída da ponte viro à esquerda e corro numa zona de lodo em que não vejo qualquer fita. “Mau, mau! Já a perder-me?” Volto atrás e ouço um grito de alguém da organização que me grita “Aqui em cima!”. Afinal estava previsto ali estar alguém a indicar, mas tinha-se ausentado momentaneamente. A subida é bastante íngreme indo dar à estrada alcatroada. Durante a subida não vejo qualquer fita, e interrogo-me senão estarei perdido novamente, mas afinal antes de chegar à estrada, lá estava uma fita indicadora e um elemento em BTT a indicar a travessia na estrada. De novo no trilho, e novamente na primeira encruzilhada há fitas para os dois lados (!?). Perante algumas hesitações, sou alcançado pelo Aníbal Godinho e pelo Cirilo. Como conhecedor do terreno, o Aníbal lidera e leva-nos pela encosta acima até cruzarmos de novo outra estrada. O trilho agora apresenta-se totalmente enlameado cheio de poças de água, sem qualquer fuga possível. Um atleta espanhol alcança-nos num ritmo muito rápido. Rio-me perante uma queda do Aníbal em pleno charco (hehehe). Faz parte do Trail.

Numa descida para uma vila, atravessamos um eucaliptal quase sem trilho marcado. Depois duma zona de hortas apanho o Carlos Couto que se vem a queixar de cãibras. Entramos de novo no mato em que descemos até uma ponte e depressa atingimos o segundo abastecimento. Até ao seguinte, sigo com o Aníbal num cavaqueio agradável até Tancos. A passagem por uma guarida militar feita com sacos de terra é merecedora duma foto, mas não tenho tempo a perder. Passamos o moinho e descemos à estrada onde está o abastecimento. Este estava repleto de bananas, laranjas, marmelada, isotónico, água e coca-cola. Estávamos no km 29 e devia faltar cerca de 10 km. O Aníbal mal comeu e desapareceu logo. Passamos pelo túnel sob a linha do comboio (atenção aos mais altos!!) virando depois para a passagem de nível. Atravesso a linha de caminhos-de-ferro e subo ao moinho. Aqui apanho o Primo da CLAC e seguimos juntos um par de km mas depressa deixo o Primo para trás.

Tendo o Castelo de Almourol e a linha ferroviária à esquerda, sigo por um trilho muito enlameado que serpenteia a serra. A certa altura perto das colmeias, surge uns sobe-e-desce num piso de brita até que chego a uma descida bastante difícil e apenas vejo uma fita cor-de-laranja. Noto que me perdi de novo. Quando me preparo para voltar atrás, vislumbro de novo umas fitas junto à passagem de nível, e penso para comigo: “Querem mesmo que faça esta descida radical!”. E lá vou eu… (só no final é que soube que num dos topos do segundo sobe-e-desce, junto a uma casinha branca, eu deveria voltar à direita, só que eu a subir vinha com os olhos pregados ao chão!).

Afinal as fitas eram as sinalizadoras do percurso dos Caminheiros! Esta descida leva-me a uma estrada que vai desembocar no parque de V. N. da Barquinha. Sigo pelo piso vermelho, atravesso todo o parque num ritmo muito rápido e apercebo-me que algo está mal! Não vejo o Aníbal… será que se perdeu? Atravesso a vila, subo uns degraus e encontro outros com um corrimão verde com uma fita sinalizadora. Sigo as fitas, atravesso de novo a linha férrea e começo uma enorme subida num piso de seixo solto e bastante íngreme, entre eucaliptos. Quase no topo da subida, vejo um atleta que desce e digo-lhe que vai enganado. Logo depois, ouço alguém a gritar que estávamos enganados. De regresso ao verdadeiro trilho, passa-me o João Faustino, vindo atrás dele o Primo, o Cirilo e o Espanhol. Tinha perdido o último abastecimento, alguns lugares e percorrido cerca de 2,5 km a mais.

Aborrecido comigo mesmo, faço a descida num ritmo muito rápido afim de tentar ocupar o meu devido lugar na classificação, mas como o piso estava tão enlameado acabo por escorregar e dou uma tremenda queda na lama (Ah, estavas-te a rir do outro, heim!!??). Levanto-me de imediato, a tempo de ouvir um Bombeiro a perguntar-me se estava bem, e tento recuperar os lugares perdidos.

Perto da A23, a placa indica 4 km para o Entroncamento. Alcanço o Carlos Couto que se admira de aparecer agora. Sigo com ele um pouco, ele vai gerindo as dores nos músculos e como é a descer largo-o e imprimo um bom ritmo. Sinto-me bem e sei que a meta está próxima! Chego à ponte, vejo o Zé Brito que me diz que tenho que atravessar o rio. Porreiro, pá! Vou lavar a lama dos pés. Com a água pelos joelhos atravesso o rio e entro no Parque do Bonito.

Como falhei o último abastecimento, vejo um bebedouro com água e vou-me hidratar para o km final. Um mal nunca vem só… com a pressa o fio de ouro que tenho ao pescoço prende-se no manipulo e parte-se! Raios… apanho o fio e falta-me uns símbolos e o crucifixo. Com isto, passam-me um atleta de laranja e o Espanhol. Retomo o rumo e consigo alcançar este último, e entramos de novo num trilho a subir enlameado atrás do atleta de laranja. Quando descemos, vejo a meta e faço os últimos 200 metros ao despique com o atleta que me precede, mas ele ainda tinha forças para me bater nos metros finais!

Após concluir a prova, volto de novo ao bebedouro para ir resgatar o que sobra do fio (e nem que tenha de arrancar o bebedouro, mas vai ter de me devolver o que lá ficou). Com a ajuda do Zé Brito, acabo por recuperar o que pensava perdido. Ainda bem!

Mas nem todos os males ficaram por aqui. Após ver as classificações finais depois do almoço… verifiquei que o que estava á disputa nos metros finais era o 3º lugar do escalão!! Bolas… bolas… fica para a próxima!!

No meu cronómetro marca 3h56’28” em cerca de 42.180 mts percorridos. Uma maratona!!
 Fui 23º da geral em 174 atletas chegados. Como troféu de participação um ladrilho com o símbolo da prova.

Resumindo:
Uma boa prova elaborada num percurso muito diverso, com umas paisagens lindíssimas, mas bastante técnico no verdadeiro espírito de Trail e dura q.b.. Bastante exigente a nível muscular. Mas merece a pena repeti-la!

Parabéns à CLAC pela simpatia com que nos receberam, em especial ao Brito e à Otília! A prova estava muito bem organizada com bastantes elementos, tanto nos abastecimentos como ao longo do percurso.
Se me perdi... a culpa é apenas minha. Nas fotos que a minha esposa tirou, estavam lá bem visíveis as fitas.

Mais uma vez se mostrou que temos boas organizações e bons percursos no nosso país, dignos para preencher um bom calendário de Trail.

PARABÉNS CLAC

 

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